Império midiático do futebol

Falta de visibilidade ofertada para outras modalidades esportivas no Brasil

Por Iane Lima

Encerrou-se, dia 08 de outubro, o Campeonato Mundial de Ginástica Artística, que ocorreu em Antuérpia, na Bélgica. Além do espetáculo oferecido pela equipe brasileira, chama a atenção as poucas opções de transmissão quando comparada à disputas futebolísticas. Ainda mais por ser um esporte de extrema competitividade, com cerca de oito provas, nas quais são analisados grau de dificuldade dos movimentos, qualidade artística e rigor técnico. Postura perfeita, pernas retas, equilíbrio após rodopios compõem algumas das dificuldades enfrentadas pelos atletas.

Há mais de dez emissoras cuja programação inclui pelo menos um campeonato de futebol, nacional ou estrangeiro. Entre eles ESPN, SporTV, Premiere, TNT Sports, FoxSports para citar apenas canais televisivos por assinatura. As finais de ginástica, por outro lado, foram cobertas pelo SporTV, CazéTV e Canal Olímpico do Brasil. Quanto as classificatórias, tiveram transmissão europeia exclusiva através da All Gymnastics TV.

Reprodução do Google

É possível notar certa dificuldade em acessar não somente o ao vivo, mas a simples informação de que haveria tal disputa. Apesar da presença de gigantes do meio como Arthur Nori, Daiki Hashimoto, Lukas Dauser, Simone Biles, Shilese Jones, Rebeca Andrade, Yeo Seojeong, entre outros ginastas, houve déficit na difusão de chamadas para atrair público.

A classificação da ginástica artística como olímpica parece limitá-la a tal competição, pois consagra momentos de maior transmissão e, consequentemente, visibilidade. Contudo, não impede que seja confundida com suas variações, ginástica rítmica e de trampolim, igualmente esquecidas. Mundial, Copa do Mundo, junto a campeonatos continentais, como os Jogos Pan-Americano, integram pré-olímpico, fase de seleção dos atletas, entretanto não recebem engajamento. Velha história de comemorar a medalha, sem assistir trajetória.

Deve-se ressaltar a existência de 32 esportes cotados para os Jogos Olímpicos de 2024, porém nenhum recebe metade do destaque dado ao mais popular, o futebol. Há quase um acordo social, reforçado pela mídia, de que quando a seleção do “país do futebol” está em campo outros atletas tornam-se irrelevantes. Apesar disso, o Brasil atingiu a marca de 104 atletas para as olimpíadas de Paris com apenas 18 futebolistas.

Em projeto experimental feito na Universidade Estadual Paulista (UNESP) pelo estudante de jornalismo Henrique Gasparino, declara-se: “Pós e pré-jogos, jornais diários sobre bastidores de clubes de futebol, mesas redondas; ou seja, cada lance é visto e analisado inúmeras vezes por diversos profissionais (jornalistas e não jornalistas), enquanto em outros esportes é possível acompanhar apenas a partida em si. Estes dados são verdadeiros em um canal por assinatura, caso a programação de um canal aberto seja analisada, raramente, será encontrado outro assunto que não futebol.” 

Diante do exposto, pode-se analisar redes sociais como o Instagram oficial do Flamengo, time do qual fazem parte Rebeca Andrade e Flávia Saraiva, medalhistas brasileiras no Mundial de Ginástica Artística. Nele, fizeram publicações parabenizando as competidoras —nada muito incisivo ou, mais importante, prévio. A segunda conta, destinada às equipes rubro-negras de outras modalidades, possui 2,1 milhões de seguidores, 16,4 milhões a menos do que a primeira. Deixando essa abrangência de mídia e público ainda mais evidente.

Segundo pesquisa realizada pelo site Salário, a média do piso salarial para atletas da ginástica no Brasil é menos de R$4.100,00 enquanto jogadores de futebol podem chegar a receber mais de R$7.800,00. Números econômicos refletem na propagação esportiva e vice-versa. Sem a parte de comunicação, campeonatos enfrentam dificuldades de prosseguimento, seja pela venda menor de ingressos, pelo baixo acompanhamento extra-ginásio, ou por ausência de patrocinadores.

Na mesa redonda da oferta-demanda, marcas escolhem times e esportes que trazem  quantidades elevadas de torcedores, portanto de lucro, também para financiamento das próprias equipes. Atletas brasileiros conquistam diversos prêmios todos os anos através de pouquíssimo investimento, sem emissora que lute por direitos de transmissão ou se empenhe em espalhar bons resultados. 

O esporte, em sua maioria, nasce no país sul-americano por meio de programas sociais. Crianças e jovens, muitas vezes de lugares carentes, esperam oportunidade de ingressar nas atividades, necessitados de incentivo governamental e midiático. É preciso que haja interesse dos principais veículos de transmitir gama maior de competições, mostrar percursos distintos, possibilidades de crescer dentro do atletismo, para além do futebol e da ginástica artística. 

Em um território onde questões de fome, pobreza e saúde são tão evidentes, torna-se imprescindível que trabalhos sejam realizados a fim de alcançar melhorias e minorias. Comprovadamente, esporte é uma ferramenta, mas antes de usufruir, a população precisa saber que ela existe. Cabe à mídia disseminá-la.

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